25.2.07

uma personagem

A minha personagem seria uma mulher morena e surpreendentemente entendiada. Ela estaria ali, especificamente naquela hora, por tédio. Com sua mão direita no queixo, a coluna em L e as pernas em X, observaria, do alto de sua varanda, os transeuntes daquela tardinha amarela.

Seria uma tardinha excepcional, já que minha personagem não se entediaria com freqüência: seria dona-de-casa, enquanto o marido que eu lhe daria seria médico - clínico geral - e, neste momento inexplicável de tédio de minha personagem, estaria ele no consultório, consultando. Seus três filhos, todos de idades distantes, seriam uma menina, um rapaz e um jovem homem, estudante de medicina. Quanto aos afazeres domésticos de minha personagem, estes comeriam, se não inteira, uma bela fatia de suas horas, não sobrando migalha que fosse para ocupar com aquele inesperável tédio de agora.

Prontinho: com minha personagem localizada numa varanda, com três filhos, um marido médico e um tédio ensandecedor, posso deixá-la existindo, perscrutando a calçada inflamada com a cacofonia dos passos, naquela tarde amarela, tão, inexplicavelmente, tediosa.

A idéia eu roubei daqui. Com todo respeito.

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