Uma cena de Mais Estranho que a Ficção que me deixou intrigado foi a que Robert Crick está no apartamento de Ana Pascal, e esta mostra-lhe seu violão, pedindo a ele que toque. Crick diz conhecer apenas uma música, e que, por ser iniciante, seria melhor não tocá-la, recusando a oferta de Ana. Ela sai para a cozina lavar os pratos do jantar improvisado que os dois repartiram, e Crick fica sozinho na sala, com o violão; uma olhadela de soslaio e a cumplicidade da meia-luz lhe inspira coragem: retira o instrumento do suporte, cerra os olhos e começa a tocar Whole Wide World, do Wreckless Eric.

Crick começa cantando baixinho e tocando nas cordas levemente, pouco mais que o inaudível. Enquanto isso, Ana está na cozinha, terminando a lavagem dos pratos. Quando fecha a torneira, consegue ouvir a melodia envergonhada vinda da sala. Ela segue, então, para a sala, se aproximando, e senta-se ao lado de Crick, que ainda não percebe sua platéia. Agora ele canta mais alto, tocando nas cordas com firmeza, o polegar apoiado no indicador. Ana sorri. Crick sente sua presença e abre os olhos. Notando que é assistido, sua voz vai cedendo à timidez, mas antes que isso possa acontecer, Ana avança, derrubando o violão, e beija-lhe avidamente.

O que me encuca é o porquê dessa reação tão impulsiva da personagem de Maggie Gyllenhaal. Ana é passional e largou a faculdade de direito para cozinhar biscoitos. Tudo bem. Até poderia ser esta a explicação, e eu até poderia aceitar, vendo os lábios dela moverem-se em sincronia com os de Crick na parte do
to find out where they hide her. Poderia, se não me houvessem dito - uma amiga - que a razão de Ana ter pulado em cima de Crick é ele estar
tocando de olhos fechados.
Como não se entregar à verdade desta sentença?